Empresas de todos os portes e ramos de atividade, inclusas as pequenas e micro, devem prestar atenção no contexto socioeconômico atual que exige a adoção de programas de prevenção e combate à corrupção. José Samurai Saiani, especialista em Direito Societário do Saiani & Saglietti Advogados, diz que há recorrente equívoco quando se trata da prevenção de atos de corrupção. Muitos empreendedores demonstram supor serem as regras da Lei Anticorrupção aplicáveis somente às grandes empresas.
Diante de uma lei específica anticorrupção e o crescimento exponencial de investigações do Ministério Público, Federal e dos Estados, tribunais de contas, ouvidorias e outros órgãos reguladores, as empresas estão compelidas a praticarem de forma cada vez mais transparente as regras de conformidade empresarial, do inglês compliance. Estas ações se resumem aos mecanismos que garantam o estrito cumprimento das leis brasileiras e internacionais.
O empresariado deve considerar também a cadeia de relacionamentos no qual a integridade corporativa se estende desde as maiores empresas num processo em rede que chega aos pequenos e médios negócios. Os cuidados a serem tomados até mesmo nas questões envolvidas com a livre concorrência do mercado e, especialmente, nas políticas de governança corporativa. No cenário, diz José Samurai, o compliance deixa de ser mera recomendação ou orientação para se tornar obrigação legal, e até comercial, a ser cumprida nas empresas e em todas as relações comerciais, em quaisquer níveis e ramos de atividade, estabelecidas com o poder público.
A lei dispõe sobre a responsabilidade civil da pessoa jurídica em práticas ilícitas com entes públicos e dispõe sobre os pontos a serem considerados na aplicação de penalidades, como a existência ou não de medidas de integridade corporativa. A maior consequência do descumprimento da lei se encontra na proibição das empresas em participar de contratações públicas e nos danos à imagem institucional, além de multa de até 20% do faturamento do ano anterior. A ausência de práticas sólidas de compliance ainda pode dificultar variados acordos empresariais como fusões e aquisições. O grande desafio não está no estabelecimento dos programas de integridade, mas na sua eficiência no objetivo de frustrar quaisquer práticas de ilícitos e, por consequência, evitar as penalidades legais, diz.
As mudanças no relacionamento entre organizações privadas e Estado, em nível internacional, ocorrem desde 1977, explica José Samurai. O primeiro passo foi o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) nos Estados Unidos para o enfrentamento à corrupção transnacional praticada por pessoas físicas ou jurídicas. Mas a legislação não foi capaz de evitar escândalos como da companhia energética norte-americana Enron, em 2002, e outros casos de corrupção. O resultado, alinhado ao combate ao terrorismo, narcotráfico e sonegação fiscal, foi o surgimento de novas leis e tratados. São exemplos as leis Sarbanes-Oxley Act e Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA), ambas dos EUA, e os acordos para trocas de informações automáticas entre as receitas federais do mundo todo como previsto no acordo da OCDE.
Mas o especialista faz um alerta. Mesmo com avanços trazidos pelos acordos internacionais e Lei Anticorrupção, a legislação brasileira é carente de disposições claras e objetivas para as fraudes e corrupção exclusivas do campo privado. José Samurai diz que o Bribery Act de 2010, a Lei Antissuborno do Reino Unido, é a única legislação específica de todo o mundo sobre corrupção no ambiente privado. Uma lei específica no tema não só evitaria atos de corrupção, mas evitaria prejuízos à vida financeira das empresas. O último Report to the Nations, da Association of Certified Fraude Examiners (ACFE), pesquisa on-line mundial de percepção de fraudes com 42 mil peritos, informa que atos ilícitos causam perdas superior a U$ 6,3 bilhões anuais, cerca de R$ 20 bilhões, ao caixa das empresas.
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