Por José Samurai Saiani*

 

19 dezembro 2017 | 09h30

O intenso, profundo e detalhado noticiário sobre a delação ou colaboração premiada dos sócios da empresa J&F levantaram enormes dúvidas relacionadas às práticas políticas, de negócios e do funcionamento da polícia, do Ministério Público e do Poder Judiciário.

Como tudo que se conta precisa ser provado, depois de intenso bombardeio, não veio a terra arrasada.

De fato, feneceram as impressões de se estar diante de denúncias capazes de extinguir a galáxia – afinal, o fim do mundo foi prometido com as revelações da Odebrecht.

Para a sociedade, restou a impressão dos abalos se restringirem a suspeitas sobre o uso do banco oficial de fomento econômico como instrumento à busca de recursos para campanhas políticas. Mas a ideia – aventada por muitos – de que nada mudou é imprecisa.

A forma como foi estruturada a delação da J&F, o que saiu até o momento na imprensa e o nível das pessoas envolvidas na reviravolta dos fatos têm sim a capacidade de gerar dúvida sobre a eficácia e a continuidade do instituto da colaboração premiada. Mas apenas para quem se atém à interpretação do que é coberto pela mídia.

O objetivo, a estrutura e os meios para atração de colaborações premiadas permanecem incólumes.

Como a Lei Anticorrupção e os acordos de leniência, as delações premiadas são figuras novas na legislação.

Suas aplicações foram intensificadas no rol de escândalos a partir da Operação Lava Jato.

Das reservas quanto ao seu uso passou-se- num tempo bem curto – para o entendimento de ser ferramenta legítima para estratégias de defesa. A jurisprudência está sendo construída pela cauda longa da Justiça.

Essa cauda compreende a sua aplicação em milhares de casos por todo o país.

Processos que mal conseguirão chegar aos blogs de comunicação das localidades onde ocorrem. Mas para os quais as autoridades públicas têm a obrigação de apurar e diante de indícios, instaurar inquéritos, apresentar denúncia e dar andamento ao devido processo legal.

O instrumento está sendo usado cada vez mais intensamente.

Outra coisa superimportante que precisa ser mais e melhor informada é sobre a intenção natural da delação premiada combinada com os acordos de leniência e a legislação contra atos de corrupção. A aplicação da justiça não deve gerar danos que punam além dos culpados.

Isso significa muitas vezes aplicar a lei apenas sobre as pessoas responsáveis pelos atos criminosos, evitando-se ampliar os prejuízos econômicos decorrentes destes processos para a empresa e toda a cadeia de fornecedores envolvida.

A aplicação de multas relevantes e a exigência de aplicação de ambiente livre das influências que levaram a prática ilegais são as virtudes de casos como a da gigante alemã Siemens. Não deixaram quebrar, preservaram empregos, afastaram os responsáveis, criaram uma nova realidade.

A legislação brasileira tem o mesmo intuito e estabelece mecanismos capazes de fazer o mesmo.

Precisamos apenas saber como cumprir isso.

Se não o fizermos, o problema não será se o estatuto legal funciona ou não.

Mas saber as razões de porque nós – operadores do direito e aplicadores da Justiça – não conseguimos fazer que funcione.

Esta mudança depende mais do que temos como objetivo de longo prazo enquanto compromissos com o país do que de interesses que influenciam no momento da adoção das medidas judiciais.

*José Samurai Saiani, sócio do Saiani & Saglietti Advogados

 

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